quinta-feira, maio 19, 2005

texto de ana paula nascimento

Dia do Nada: happening na praça dá margem à reflexão
DIA DO NADA
Uma data para mudar o cotidiano
Ana Paula Nascimento

Criar a suspensão do cotidiano. Essa é a proposta principal do Dia do Nada, movimento artístico que entrou esse ano na sua quarta edição e virou motivo de polêmica ao mostrar em um das suas performances o nu como forma de manifestação artística. Celebrado depois do Dia do Trabalho, no último dia 2 de maio teve como resultado a prisão de três integrantes por ''ato obsceno'' - pelo nu de dois integrantes - e ''desacato à autoridade'' - em decorrência de uma estudante ter chutado as nádegas de um policial e ter jogado uma bolsa de crochê em seu rosto. Após cinco horas de prisão, os três foram liberados e aguardam audiência pelo termo circunstanciado aberto contra eles.
Instalado na Praça Rocha Pombo, o 4º Dia do Nada reuniu diversas manifestações artísticas. Mas, afinal, o que significa a comemoração para os que se dispõem a levar a expressão artística às últimas consequências?
''O Dia do Nada pretende fazer com que as pessoas percebam situações em que elas vivem e que normalmente não se dão conta. A idéia é promover a desmecanização do cotidiano'', argumentou o artista plástico e colunista da Folha, Rubens Pillegi Sá, idealizador do projeto, que também foi preso.
Sobre o nu, Sá vê com naturalidade a manifestação que integrou o seu trabalho intitulado ''Corpo sem roupa, roupa sem corpo''. ''Em nenhum momento tivemos a intenção de protestar contra nada. Não é como nos anos 60 que através do nu se defendia o amor livre, se protestava contra a ditadura. Simplesmente o nu fez parte da nossa performance e é interessante notar que o problema maior é o nu masculino. O corpo nu da mulher já foi banalizado, é a carne mais barata do mercado e as pessoas se incomodam menos'', argumentou.
Na opinião do artista, cada pessoa carrega seu repertório de ''filtros'', repletos de preconceito, tolerância, humor e disponibilidade para tentar compreender algo novo e diferente. ''Não tem como o artista interferir na compreensão das pessoas. Há liberdade para compreender com o próprio repertório, mas acho interessante a reflexão se Londrina pretende ser uma cidade com mente provinciana ou de espírito cosmopolita'', afirmou.
Sá lembra que o nu, que há cerca de 15 mil anos já era retratado em pinturas rupestres, passou a chamar mais atenção do que as prostitutas e usuários de drogas que frequentam a praça diariamente. ''O estranhamento é mais pelo moralismo, o preconceito e a questão da tolerância'', destacou, lembrando que a versão do evento em 2003 também teve um nu feminino que não acabou em prisão. ''O Dia do Nada não é contra o trabalho. Ele é contra a ganância de alguns segmentos que escravizam a sociedade'', acrescentou.
Chamados de ''palhaços'' por um apresentador de um programa policial televisivo, Sá disse que a afirmação não os ofendeu já que eles, enquanto artistas, levam alegria e diversão para as pessoas, ''ao contrário de outros que sobrevivem da miséria humana''.
Serviço:
- Para mais informações sobre o Dia do Nada, confira o site www.nothingday.hpgvip.ig.com.br. Até o final do maio está previsto o lançamento da revista sobre a edição do 4º Dia do Nada.
rubenssa@onda.com.br

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