terça-feira, maio 03, 2005

folha de londrina 03/05 - folha2

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HAPPENING - Um 'nada' muito criativoMarcado este ano por performances mais elaboradas, o Dia do Nada, em sua 4º edição'' parou transeuntes na Praça Rocha Pombo, em Londrina

O olhar indagador das pessoas era constante na Praça Rocha Pombo, ontem à tarde, onde dezenas de artistas se reuniram para celebrar o ''4º Dia do Nada'', que tem como proposta fazer uma reflexão sobre o ócio depois do Dia do Trabalho. Chamado de happening, o manifesto reuniu diversas expressões artísticas como forma de chamar a atenção das pessoas. Até uma manifestação de ''nada de roupa'' quase aconteceu, frustrando um grupo de adolescentes que desde o meio-dia estavam na praça à espera do nu completo, que havia sido divulgado previamente como parte da instalação ''Corpo sem roupa, roupa sem corpo''. ''Por favor, você pode me explicar o que significa isso?'', questionou-me o aposentado João Messias, 75 anos, que sentado na escada da praça acompanhava a manifestação. Sem trabalhar há cinco anos, disse que achava a vida mais interessante quando estava na ativa. Como lazer, costumava visitar os amigos. ''Era dono de madeireira e 'não fazia nada'...'', brincou o aposentado que se redimiu dizendo que acordava às cinco da manhã todos os dias. ''E não estou achando muita graça disso que eles estão fazendo', afirmou o aposentado, que mesmo assim permaneceu sentado observando as performances.
Do outro lado do jardim, as câmeras digitais e de televisão se voltaram para o quase nu artístico da estudante que pediu para não ser identificada. Sentada no gramado junto com amigos que fumavam cigarros e tomavam vinho, ela tirou a a calça, a blusa e o sutiã. Depois de colocar o violão na frente do corpo, só de calcinha, cantou algumas músicas, mas depois acabou vestindo sua roupa. ''Fiquei meio constrangida. Achei que mais pessoas iriam tirar a roupa também. Mas valeu como manifestação artística'', comentou a estudante.
Na parte de maior trânsito da praça, foi montado um varal com várias peças de roupas engessadas penduradas, além de roupas espalhadas pelo chão que podiam ser levadas pelos transeuntes. No varal também foram colocadas peças do trabalho artístico de Ariany Cristina Damas. ''Sudáryos'' denomina os pedaços de tecido de algodão com impressões de tintas sobrepostas sobre o corpo da própria artista. ''Esse trabalho reflete a impressão como o mundo me vê, indago a questão do digital, da identidade corporal. Acho que o Dia do Nada contribui para fazer com que as pessoas pensem que 'quando não se faz nada' também se está produzindo. O trabalho de pensar também é extremamente significativo'', disse a artista.
E como tudo é válido no Dia do Nada, até sopa de pedra virou atração. Montada de forma improvisada, uma lata de tinta virou panela sob lenhas amontoadas entre placas de concreto. O artista-cozinheiro foi João Carlos Zaniolo, autor da performance ''Fomiséria''. ''O meu trabalho é um lembrete destacando que hoje tem um monte de gente comendo sopa de pedra, uma água quente com farinha, por exemplo. É uma forma de protesto para ver se a situação melhora'', ressaltou.
Quem não pode ser questionado foi o casal de artistas que sentados frente à frente iriam ficar cerca de quatro horas amarrados em cadeiras, isolados, com os ouvidos, os olhos e a boca vedados (no momento da reportagem eles já estavam há duas horas e meia nessa situação), na ''Performance da Incomunicação''.
O artista plástico Rubens Pillegi Sá, idealizador e organizador do evento, destacou que a escolha da praça para o Dia do Nada foi proposital. ''Ela é o nada que tem vida entre dois espaços mortos (Museu de Arte e Museu Histórico), inoperantes, rodeados por grades. Hoje a praça é um local frequentado por prostitutas e usuários de drogas, bem no coração da cidade. O ideal seria que houvesse uma ação participativa do poder público e não excludente. Sobre a manifestação, é uma forma de mostrar que não existe dicotomia entre trabalhar e não trabalhar. O mundo sempre está em movimento e o seu corpo reage, trabalha.'' A partir deste ano o Dia do Nada entra em novo formato. Durante o ano serão apresentadas performances dentro da proposta, independente da data comemorativa de 2 de maio. Palestras também estão sendo planejadas para reforçar o debate sobre o tema. O Dia do Nada também teve manifestações em São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza, Bahia e Macapá. Mais informações sobre o Dia do Nada no site www.nothing-day.hpgvip.ig.com.br.
Ana Paula NascimentoReportagem Local

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