Muita gente
tem um passatempo na vida. Uns colecionam carros, outros colecionam selos. Há pessoas
que usam seu tempo livre para praticar um esporte. Outros, para se divertir. Há
os que esperam chegar o fim de semana e vão ao bar, beber. Ou saem para dançar.
Quanto a mim, todo tempo que me sobra gasto em preencher uma coleção que jamais
chegará ao fim. Eu coleciono nuvens. É. Nuvens. Todas as tardes, antes do sol
se colocar inteiramente no poente, saio apressado portão afora de casa à cata
delas, que se modificam velozmente e se tornam outras e mais outras. E no outro
dia é tudo igual, mas também é tudo diferente. Não se repetem as formas. Mas
também não se repetem as cores que elas capturam do céu, tornando-as únicas a
cada olhar.
Você deve
estar se perguntando como eu as capturo para a minha coleção, mas não se
coleciona nuvens como quem coleciona seixos, por exemplo, pois nuvens são muito
mais etéreas, sem chegar a ser como os sonhos. Quem coleciona sonhos sabe que
não pode contar com o volume, densidade, espessura ou textura da forma em suas
mãos, ainda que, no sonho, aquilo que foi sonhado pareça real. Digamos que uma
coleção de nuvens é mais parecida com uma coleção de estrelas, apenas que você
não pode contar com mapas para catalogá-las e juntá-las em constelações.
Todavia,
para além das categorias dos nimbos, cúmulus e cirros e as derivações que se fazem destas, desenvolvi uma técnica
própria para torná-las, ainda que de modo efêmero, minhas. Aquela, gorda,
grande e branca que deixa-se contaminar por um raio de luz vermelha, ela agora está
grávida de cor. Calculo seu tamanho pela proporção que varia da volúpia carnal
à distância do beijo leal entre dois amigos. Outra, que desce cinza escuro do
céu para pousar na linha do horizonte, concebo-a como nuvem macho e sei que é
dada aos sentimentos. Por pouco não chora, fechando o dia para melancolias ou
uma sessão de pipocas diante da TV. Algumas, mais extrovertidas, me pedem para
tirar foto delas (você não sabia que nuvens gostam de tirar fotos?). E é por meio
das fotos que elas me concedem tirar que me distingo delas e evito tornar-me um
nefelibata. Se assim fosse, não poderia sentir forte vontade de morrer, quando
o avião decola e as recorta enquanto ganha altitude, como aconteceu da última
vez. Era como se transpassássemos uma cadeia de montanhas gigantescas ou,
senão, uma imensidão macia de cores quentes e frias se misturando ao branco e
cinza e prateado e dourado sobre o azul do céu de fim de tarde. Aquilo era o paraíso
que mamãe me contava. Que tinha um Deus sorridente me esperando para a
eternidade. Era aquilo que eu queria ter, mas sabia que não pertencia àquilo,
ainda.
Desde então,
tenho cada vez mais me afeiçoado e me aperfeiçoado na técnica de colecioná-las.
Todo pôr-do-sol é oportunidade. Toda chuva se armando de um dos lados da cidade
é motivo para mais uma busca. Hoje é um arco íris inteiro. Amanhã, uma franja
em forma de nuvem. Depois, um carneirinho, um elefante, um dragão. Tenho todas
elas e nenhuma delas é minha, porque são do instante. São de quem consegue ver
pureza e graça em nada ser. São de quem se deixa ser delas e se tornarem,
também, efêmeros com elas. E livres, uma vez que são filhas da água e
sacerdotes do vento.
Posto,
abaixo, algumas amostras de minha coleção. No entanto, perdi as fichas de
informação sobre as imagens e não sei mais exatamente do que se tratam, dado
que minha surpresa, diante de tanta beleza, tirou a concentração e nada pude
fazer senão o click da foto. Peço a gentileza, caso alguém se permita a vê-las
e, vendo, tiver desejo de nomeá-las e comentar sobre elas, que assim o faça,
certo de que farei desses comentários a legenda de minhas nuvens, compartilhando,
em autoria, tal esforço de catalogação.
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